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Seminário sobre Racismo Ambiental, Patrimônio e Preservação Cultural debate políticas públicas para a sociedade

Numa promoção do LEAFRO/UFRRJ – Laboratório de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas da Universidade Rural, aconteceu no último dia 1º de dezembro o Seminário “Racismo Ambiental, Patrimônio e Preservação Cultural: desafios para as políticas públicas”. O evento teve lugar no auditório do Instituto Multidisciplinar (câmpus Nova Iguaçu da UFRRJ) e contou com as presenças do professor Renato Ferreira, do curso de Direito do IM/UFRRJ e doutor em Direito, o qual atuou como mediador; do professor Otair Fernandes, doutor em Ciências Sociais e professor do IM/UFRRJ e do PPGPaCS – Programa de Pós-Graduação em Patrimônio, Cultura e Sociedade; de Giselle Florentino, coordenadora-executiva da Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial, mestranda em Sociologia no Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP), vinculado à UERJ; e da vereadora Tainá de Paula, arquiteta, urbanista e Secretária de Meio Ambiente e Clima da cidade do Rio de Janeiro.

Em sua fala inicial, o professor Otair saudou a presença no evento da secretária do Meio Ambiente Tainá de Paula, ocorrido no câmpus da Universidade Rural em Nova Iguaçu. Segundo ele, tal fato reforça a percepção da importância da Baixada Fluminense no contexto sociopolítico do estado do RJ. O professor Otair também chamou a atenção para o câmpus da Universidade Rural aqui instalado, em Nova Iguaçu, um espaço público, gratuito e de excelência na questão da Educação, da reflexão e dos debates, socialmente referenciado e acessível ao povo pobre e periférico da Baixada Fluminense. Otair também saudou a presença da ex-aluna da UFRRJ Giselle Florentino, egressa do Programa PET Conexões, e também do professor Renato Ferreira, que mediou o encontro ocorrido no auditório do câmpus Nova Iguaçu da UFRRJ. Ele ressaltou a importância da interseccionalidade e transversalidade com a negritude, o trans, o jovem, a defesa do meio ambiente como elementos enriquecedores do debate atualmente em voga na sociedade brasileira. Para o professor e pesquisador integrante do LEAFRO, a formação teórica tem que ser integral e que incorpore uma dimensão humana e civilizatória ao estudante. E ele citou a abordagem da questão racial, afirmando ser preciso que a universidade “coloque o dedo na ferida”, como ponto de partida para a superação do racismo ambiental no Brasil e em todo o planeta. Na opinião de Otair, só há sentido se falar em “política pública” – a nível municipal, estadual ou federal – quando forem garantidos os direitos essenciais inerentes ao bem-estar social, em favor das populações pobres e marginalizadas também pela questão racial em nosso país.

Já a vereadora pela cidade do Rio de Janeiro e Secretária do Meio Ambiente e do Clima, Tainá de Paula, frisou em seu pronunciamento o quanto é difícil construir repertório para convencer os próprios pares nessa luta cotidiana de enfrentamento contra as narrativas discriminatórias, excludentes e racistas.

A questão do Patrimônio como instrumento de combate ao racismo ambiental

Para a vereadora Tainá, a discussão do patrimônio no Brasil ainda é profundamente “embranquecido”. Como urbanista, ela envereda na questão do patrimônio cultural e é público e notório que, quando se fala no IPHAN, no INEPAC e no Instituto Rio-Patrimônio da Humanidade, todo o arcabouço patrimonialista a ser preservado e resgatado é chancelado pela academia clássica majoritariamente branca, e portanto , muito distante de nossos saberes populares tradicionais e apartado da cultura negra brasileira.

Como exemplo disso, Tainá assinalou que demorou-se muito para que tivéssemos acervos das casas-de-santo e da nossa cultura popular englobando o samba, o carnaval, o jongo e o futebol como expressão maior das manifestações culturais genuínas do povo.

Ela lembrou que muito recentemente foi tombado como Patrimônio Imaterial o tabuleiro do acarajé e a receita do acarajé. E segundo a secretária do Meio Ambiente do RJ, isso gerou uma divisão intensa na academia, uma vez que muitos pesquisadores especialistas em patrimônio histórico cultural que foram contrários a esse tombamento, assinalando a “desimportância” desse patrimônio imaterial.

Na questão do racismo ambiental, Tainá apontou ser muito importante essa dimensão do patrimônio e do valor, pois a gente compreende uma categoria que a gente preserva também. Ela observou que sempre fomos doutrinados pelos teóricos do debate ambientalista a entender que a floresta e a conservação da natureza são um instrumento condicionante para a preservação da espécie humana. Por outro lado, tudo aquilo que provém dos humanos (leia-se comunidades e povos tradicionais) é danoso e, consequentemente, não merece ser conservado. Isso estabelece um marco divisório que coloca à margem as marisqueiras, as quebradeiras de coco, os pescadores, as quebradeiras de dendê, as baianas, os quilombolas e os indígenas. Ou seja, tudo aquilo que versa sobre a territorialidade local é colocado num local de desimportância. Tainá destacou que, dessa forma, nosso patrimônio é definido e apresentado quase como uma antítese de tudo aquilo que o povo pobre e periférico representa em seu cotidiano de vida e trabalho.

Concluindo, a Secretária Tainá reconheceu que o enfrentamento ao racismo ambiental é, sem dúvida, uma busca por uma melhor qualidade de vida e um aumento na qualidade ambiental.

A próxima a fazer uso da palavra foi a mestranda Giselle Florentino, coordenadora-executiva da Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial, mestranda em Sociologia no Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da UERJ.

Giselle começou afirmando não ser mais possível a criação de novas leis, programas e modelos de políticas públicas sem antes pensar que tipo de orçamento público vai financiar essa atuação. Ela tomou como exemplo o Programa de Saúde para a População Negra, existente há pelo menos 15 anos. No entanto, nunca assistimos dentro do Sistema Único de Saúde (SUS) a aplicação dessa política específica para o povo negro, pelo simples fato de não haver verba orçamentária direcionado para esse fim, apesar de haver uma lei disciplinando esse investimento.

Giselle lamentou que o orçamento federal de 2026 para o atendimento à saúde de Mulheres Negras é de ZERO REAIS. Ou seja, o termo “mulheres negras” não figura como alvo de investimentos orçamentários do governo federal para o ano que vem. Uma solução que poderia ser usada seria a adoção da transversalidade, com o investimento na saúde das mulheres negras sendo feito a partir de outros programas, como o Bolsa-Família. No entanto, a coordenadora-executiva da Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial salientou que isso não dá conta da complexidade na questão da demanda no atendimento à saúde das mulheres negras.

Ela denunciou que a Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2026 não prevê nenhum investimento no combate ao racismo religioso e na política de promoção da igualdade racial no Brasil, constatando a ausência de verbas para o atendimento às demandas populares dos movimentos sociais.

Giselle vê com preocupação essa omissão no atendimento aos pleitos de políticas públicas para a população pobre e marginalizada, ao mesmo tempo em que enxerga com apreensão o investimento cada vez maior em segurança pública. Prova disso é o dinheiro do Fundo de Compensação Ambiental: ela informou que ao invés desses recursos estarem sendo utilizados para a preservação das áreas ambientais, eles estão sendo usados para pagar salários de policiais. O mesmo se dá com o Fundo de Combate à Pobreza, cuja verba é usada para reajustar salários de agentes penitenciários.

Já o mediador do encontro, professor Renato Ferreira, fez questão de ressaltar a importância dessas iniciativas direcionadas ao público da Baixada Fluminense. Segundo ele, as reflexões havidas foram de alto nível pois foram expressas por especialistas no assunto, que pensam e concebem as políticas públicas para o benefício das pessoas em seu meio social. Ele alertou para o fato da UFRRJ em Nova Iguaçu estar localizada estrategicamente em um território onde as políticas públicas são desvalorizadas e ignoradas. O Instituto Multidisciplinar situa-se numa região em que a população não tem acesso aos bens da cidadania, e muito menos às questões envolvendo ações na Justiça.

O professor Renato é de opinião que devemos trazer o conhecimento para esse debate acontecer em regiões como a Baixada Fluminense, com a finalidade de desenvolver consciência crítica nas pessoas e que fomente ações (e não apenas reflexões) sobre as políticas públicas a serem desenvolvidas nesses locais carentes, que são inclusive invisibilizados dentro da própria universidade. Ele garantiu que o saldo desse seminário foi muito positivo, uma vez que atraiu um público jovem, com alunos e alunas interessadas no tema, no sentido de ajudar na repercussão para toda a comunidade acadêmica e do entorno, para que todos saibam sobre o papel do Estado e da importância das políticas públicas e da necessidade do diálogo democrático nas mais variadas esferas da sociedade.

 

Professor Otair Fernandes, do IM/UFRRJ

 

Vereadora e Secretária do Meio Ambiente do RJ, Tainá de Paula

               Mestranda Giselle Florentino

      Professor Renato Ferreira, que mediou o seminário

 

Por Ricardo Portugal – Assessoria de Comunicação do IM/UFRRJ